Mario dos Santos Lima

Vivo intensamente o agora

Textos

O PREÇO DE UMA AULA

Fazendo a analogia do aluno com a matéria prima, eu diria que se no processo de fabricação o produto estiver sendo prejudicado, na sua qualidade, na sua funcionalidade pela porcaria da matéria prima, é dever do gestor eliminar este material para que o produto se apresente a contento lá na ponta de venda.
Ou por outro lado, se fizer a analogia do aluno com cliente num processo de compra e venda, e o pretenso cliente não estiver comprando, apenas enxovalhando o produto, este maldito cliente deverá ser descartado.
Eu diria que isto nem considero como meu ponto de vista uma vez que é simplesmente a lógica do negócio. A maça podre deve ser eliminada.
Bem, eu sou pelo valor intrínseco das coisas, pela ética e pelos bons costumes. Para mim, o aluno deveria vir de boa formação e conduta de berço. Com estes valores sedimentados em casa, ao freqüentar uma escola com o objetivo explícito de conviver, buscar, pela experiência dos mestres, os saberes e práticas para sua vida, estaria apto e preparado adequadamente para servir a sociedade.
É isto que acontece? Diria, com raras exceções.
O professor é desrespeitado, é enxovalhado, e sempre é considerado um velho que deveria estar aposentado. É ameaçado e muitas vezes vítima de violência.
O professor além de não ser valorizado pela grande maioria dos alunos, ele também recebe pouco apoio da instituição em que leciona. É um bucha de canhão. É a bolinha de pingue pongue no vai e vem da vontade das duas partes – alunos e instituição.
O professor se amedronta? Acovarda-se? Não, segue convencido, firme, alinhado no seu ideal quase utópico de transformar uma massa sem princípios, sem ética, sem civilidade numa obra prima. Consegue? Por alguns exemplos soltos por aí, acredita-se que sim.
Sempre vão existir mestres corajosos e idealistas.
Muitas vezes a educação que faltou em casa é necessária corrigi-la em sala de aula. Não que isso seja uma regra, mas muitas vezes a matéria prima pode ser recuperada no processo de transformação.
Foi numa atitude corajosa de enfrentamento que um professor – digo aqui o pecado, mas não conto nem quem foi o pecador e nem quem foi o padre. – resolveu, de forma brilhante, dar uma lição num fedelho, mal educado, mau caráter que assistia a sua aula.
O fedelho chegou tarde, não se ligou nas explicações e de repente, para perturbar a aula resolveu questionar:
- Poderia explicar tudo de novo? Não estou entendendo nada!
O professor até aqui calmamente, tendo acompanhado a displicência do criançola mal educada, resolveu interpor dizendo:
- A dúvida é a incerteza ou desconfiança em relação a uma idéia, um fato, uma ação, de uma asserção ou de uma decisão, assim, você poderia dizer para mim e para a sala do que estou realmente tratando e onde reina a sua dúvida?
O desconexado, de dedo em riste querendo se sair bem da enrascada perante a sala vomita:
- Seu babaca, eu pago pelas suas aulas e por isto você tem que explicar as coisas quantas vezes eu quiser!
A sala gelou. Ouvia-se o bater das asas das moscas.
O professor, sem se alterar, quase como desconhecendo os impropérios ditos pelo mal criado, abriu sua bolsa, sacou uma máquina de calcular e por alguns minutos seus dedos passearam pelo teclado numa dança nervosa e feroz.
- Muito bem! Diz o professor já num tom mais de tenor cantando duas oitavas acima.
- Você comprava a minha aula! A partir de agora não vendo mais para você. Tirou do bolso duas moedas, dirigiu-se até a carteira do mal criado fedelho, e bateu-as no tampo da mesa e vociferou, apontando para a porta
- Está aqui o que você pagou, pode se retirar!
A sala em suspense assistiu a cena.
O topetudo saiu dizendo:
- Você não sabe com quem está se metendo!
O desgraçado estava saindo sem as moedas, o professor pegou-as e entregou-as respondendo:
- Sei sim com que estou falando! Estou falando com um tremendo mal criado, um desajustado que não teve ou não soube aproveitar a educação que seus pais lhe deram, um egoísta desajustado!
O aluno saiu batendo a porta e a sala aplaudiu o professor.
O desfecho foi melhor.
O desgovernado, pensando ser o senhor da situação tentou entrar em sala de aula algumas vezes, mas recebia, implacavelmente já na porta os centavos.
Contou uma história qualquer em casa e os pais vieram furibundos a fim de tirar satisfação com o mestre.
Reunião tensa na direção. O monstro, seus pais e colegas de sala.
Tornando-se mais plácido, o professor olhando para os pais sentenciou:
- Eu aceito o retorno de seu filho desde que ele vá agora, frente à sala de aula, e se retrate.
Os pais concordaram, inclusive acompanhando o desgovernado até a sala de aula.
A atitude do calhorda serviu para os demais colegas reconhecer a grandiosidade do professor nos míseros centavos que pagam a ele.

Nota para reflexão: Visto que a maioria das Instituições pensa muito mais no faturamento que em adicionar conhecimentos, modelar a massa, será que algum professor teria coragem e peito para agir desta forma? E se agir? Qual seria o final da novela?
Mario dos Santos Lima
Enviado por Mario dos Santos Lima em 06/10/2012
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